Mas se tu me cativas, minha vida será como que cheia de sol...


segunda-feira, 24 de junho de 2013



















Mãe!
Vem ouvir a minha cabeça a contar histórias ricas que ainda não viajei! traze tinta encarnada para escrever estas coisas! tinta cor de sangue, sangue! verdadeiro, encarnado!

Mãe! passa a tua mão pela minha cabeça!
Eu ainda não fiz viagens e a minha cabeça não se lembra senão de viagens! Eu vou viajar. Tenho sede! Eu prometo saber viajar.

Quando voltar é para subir os degraus da tua casa, um por um. Eu vou aprender de cor os degraus da nossa casa. Depois venho sentar me a teu lado. Tu a coseres e eu a contar-te as minhas viagens, aquelas que eu viajei, tão parecidas com as que não viajei, escritas ambas com as mesmas palavras.

Mãe! ata  as tuas mãos às minhas e da um nó cego muito apertado! eu quero ser qualquer coisa da nossa casa. Como a mesa. Eu também quero ter um feitio que sirva exactamente para a nossa casa, como a mesa.

Mãe! passa a tua mão pela minha cabeça!
Quando passas a tua mão na minha cabeça é tudo tão verdade!

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Poema: Almada Negreiros. A invenção do dia claro, 1921.
Arte: Gustav Klimt. Mãe e filho, 1905.

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